Anilton Valverde é engenheiro elétrico e diretor da Vertical Telecom, braço do ramo de telecomunicações da Associação Catarinense das Empresas de Tecnologia (Acate). Também é um especialista em inovação para o setor de internet. Além disso, é diretor da Dígitro, empresa catarinense que desenvolve soluções de Inteligência, Tecnlogia de Informação e Telecom.
Valverde teme que o Marco Civil seja utilizado mais para interesses políticos do que para regular detalhes da vida dos usuários.
Diário Catarinense—O Marco Civil prevê a garantia da liberdade de expressão, privacidade, segurança e neutralidade na rede. Você acredita que com a nova lei aprovada pelo senado será possível alcançar esse patamar?
Anilton Valverde — Defendo a liberdade de expressão da rede, que é um ambiente que nasceu pra ser anárquico. Mas não no sentido de bagunça sem controle. Importante é não fazer do controle a censura. É uma tarefa difícil. É bom estarmos atentos à maneira como o governo irá lidar com isto. De certa maneira, acredito que vai haver censura. Nos aproximamos da China, porque o governo brasileiro não detalhou no projeto como serão as medidas para a remoção de informações da rede. Sabemos que, depois que um projeto é aprovado, fica difícil ele ser mudado. Pode virar uma forma de o governo exigir que se retire coisas da rede nos momentos em que precisar.
DC— A partir de agora, provedores como sites de relacionamento e de notícias não são mais responsáveis pelo conteúdo de terceiros. Como fiscalizar isto?
Valverde — Vai acabar acontecendo o controle rápido apenas para a aquilo que é de interesse público, como escândalos que são muito compartilhados. Já em outros casos, por exemplo, tenho uma conta em uma mídia social e digo que meu vizinho é feio. Se ele se ofender, pode entrar com uma ação, e pode ser que eu seja obrigado a retirar. Não se sabe quanto tempo vai levar. E se judicialmente alguém entender que isso vá ferir outra pessoa, pode exigir que a empresa retire a minha pulicação. O problema maior é temos empresas de fora trabalhando no País, e a legislação que funciona aqui, não funciona lá fora. Tenho medo que o Marco Civil se torne um controle estatal para interesses políticos, muito mais do que para esses detalhes que envolvem a nossa vida.
DC — O que você acha da retirada de comentários somente por exigência judicial?
Valverde — Esse é um assunto de difícil solução. Acho que o país deveria abrir um pouco mais a participação para conversar com entidades internacionais que regulamentam a internet. É um assunto difícil, porque as principais ferramentas de mídia social estão hospedadas fora do país e o Marco Civil pode se tornar inocuo. Podemos ampliar ainda mais e resolver problemas de grande porte com acordos internacionais para internet: identificar redes de tráfico, pedofilia, terrorismo. A internet é uma rede mundial e a legislação para ela precisa ser coerente com o resto do mundo. Isso é que eu acho que faltou. Não somos o centro do mundo nesse assunto. E se tivermos que pedir para empresas de fora retirarem informações, temo que vamos ter muita burocracia por aí.
DC — Você acredita que o consumidor realmente é favorecido quando as empresas não podem mais vender pacotes com restrições?
Valverde — A lei não afeta tanto as grandes coorporações que tem suas redes de dados bem definidas e mapeadas. Na verdade, é uma exigência do Estado para as operadoras que usam um dispositivo chamado IQOS, que dá uma garantia de banda de acordo com o que o usuário está usando, não seja usado. Agora a pessoa terá sempre a mesma velocidade, precisando dela totalmente ou não. O problema: quem é que vai controlar isso? É por denúncia? O usuário vai saber sacar isso? Nem sempre. Talvez os usuários mais avançados, que usam com mais frequência, mas a maioria das pessoas não saberá identificar o problema e pode ser enrolada.
DC — O marketing dirigido, como a venda de anúncios de acordo com determinado perfil consumidos, também será proibido. Como você acha que isso mudará o mercado que utiliza redes sociais para vender o próprio negócio?
Valverde — Embora seja meio subliminar, autorizamos o Facebook a utilizar nossos dados. Ele vai navegar e mapear o perfil para apresentar oportunidades comerciais. Eu não acho isso ruim, acho certo talvez os incomodados poderem pedir para bloquear o mecanismo.
Eu acho que o comércio pode ser estimulado de uma forma inteligente e produtiva, e é só respeitar a necessidade de quem recebe. A ideia de que o Facebook é de graça é uma ilusão. Ele sempre chegará até você, ou não vai sobreviver.
Fonte: Diário Catarinense